Notícia
A hora e a vez da modernização administrativa
O burocrata tende a ter uma visão burocrática até mesmo da desburocratização. É preciso colocar a coisa pública a serviço do público.
Ventos novos estão soprando pelo país. A evolução recente do processo político brasileiro, especialmente com os desdobramentos do quadro configurado pelo processo estável de crescimento econômico, potencializa a possibilidade até há pouco um sonho de promover profundas transformações democráticas na administração pública brasileira. Efetivamente colocá-la a serviço do cidadão.
A morosidade, o formalismo, a ineficiência, a apatia, a complicação e até mesmo a insensibilidade política e social do aparato institucional constituem entraves ao dinamismo da sociedade e aos verdadeiros anseios da comunidade. Modernizar a administração pública, portanto, representa um desafio essencial para os governantes, em quaisquer níveis. Sem a superação de tal desafio, será impossível pensar em descentralização administrativa, participação cidadã e consolidação de uma democracia econômica, objetivos que exigem um aparelho estatal leve, ágil, dinâmico e eficaz, a serviço real da população e dos interesses do Estado.
Modernizar a administração pública, desafio essencial para os governantes
Não se trata de fácil tarefa, contudo. O burocratismo tem fundas raízes entre nós: é, em primeiro lugar, um problema estrutural. O processo de formação histórica do Estado brasileiro consolidou uma estrutura autocráticoburocrática, pesada e lenta, que se coloca acima e por cima das forças vivas da sociedade, chegando em muitos casos a se constituir em verdadeira tirania asfixiando o cidadão comum. No caso do Rio de Janeiro, por exemplo, a longa condição de capital reforçou essas características, a elas agregando ainda difundidos vícios de nepotismo, clientelismo, venalidade e tráfico de influências. E tais defeitos estruturais só fizeram se agravar com as conseqüências nocivas de um autoritarismo que levou a máquina administrativa a uma quase onipotência sobre o corpo social.
O burocrata tende a ter uma visão burocrática até mesmo da desburocratização
Nessas circunstâncias, a própria preocupação com os entraves representados pelo aparato institucional inoperante acabaria se formando. Nos últimos anos, o problema tem sido enfocado substancialmente em termos de "desburocratização", amiúde entendida apenas como esforço voltado para as normas e rotinas internas, com uma ênfase despropositada em estruturas e regimentos. Ora, cortar papéis e exigências burocráticas constitui tarefa necessária e urgente. Mas se limitar a isso denota uma visão superficial da questão De certa forma, é o mesmo que colocar a raposa guardando o galinheiro: por melhores que sejam as intenções, o burocrata tende a ter uma visão burocrática até mesmo de desburocratização. E então ficase nos sintomas, sem atacar as causas da doença.
O que importa, fundamentalmente, é modernizar e transformar a administração pública com base em um novo modelo de gestão governamental. Tratase de atacar os pontos críticos da administração a partir do ponto de vista e com a participação das forças econômicas e sociais do Estado, visando fazer a administração da coisa pública voltada para o público de modo que toda a máquina administrativa se transforme em fator de desenvolvimento e não em obstáculo ao dinamismo da sociedade. E, como a burocracia não pode gerar desburocracia, impõemse a formulação de políticas e a criação de instrumentos específicos capazes de promover essa transformação, inclusive desenvolvendo canais eficientes e sistemáticos de participação das forças econômicas e sociais nesse processo.
Só a integração do necessário esforço interno com a desejável pressão externa poderá mover o aparelho administrativo nessa nova direção. E preciso suscitar uma mecânica de participação dos setores econômicos e da opinião pública para que se possam identificar concretamente os pontos de estrangulamento que asfixiam o desenvolvimento econômico e a vida dos cidadãos. As forças vivas do Estado precisam ser sistematicamente ouvidas, pois só assim se terá condições de isolar e superar os entraves paralisantes do aparelho estatal.
A par da extensa e plena utilização dos órgãos da administração indireta, por natureza mais dinâmicos e ágeis, e preciso também formular diretrizes e desenvolver mecânicas internas que promovam uma ampla modernização da administração pública como um todo. Para tanto é imprescindível uma profunda revisão da orientação governamental em três aspectos: informação, decisão e auditoria. O amplo uso da máquina de processamento e informação de dados a serviço efetivo das prioridades de governo e dos programas sociais e econômicos é fator decisivo para tornar mais rápido e consistente o processo decisório. Este, por seu turno necessita de descentralização, iniciativa e autonomia operativa no quadro das políticas globais, com um espírito gerencial mais desenvolvido. E, para tanto, a auditoria deve se voltar, sobretudo, para a informação, a orientação e o apoio consultorial, tendo em vista a superação dos problemas operacionais dos órgãos de linha. E isso implica um grande e ordenado esforço de treinamento e conscientização dos agentes da administração pública em todos os níveis bem como a reformulação de políticas e diretrizes em cada setor.
Muito já foi feito neste campo de modernização mercê da imensidão de ferramentas tecnológicas de que se dispõem atualmente. Mas muito mais precisa ser feito, pois, mais do que tudo é preciso colocar todo esse potencial tecnológico conceitual e operacionalmente a real serviço do cidadão.
É preciso fazer a administração da coisa pública voltada para o público
O atual processo de renovação também estável do quadro político brasileiro possibilita concretamente um amplo esforço de transformação e modernização da administração pública, para que ela se volte efetivamente para o bem público e social, a serviço das forças vivas da sociedade e do cidadão comum. Nesse processo, um relevante papel caberá sem dúvida aos profissionais de administração. Hoje, cresce como nunca a idéia de encontrar soluções brasileiras para os nossos problemas de administração, tanto na área empresarial como pública. As teorias e técnicas da administração são objeto de intensos debates, em nosso meio, visando buscar caminhos concretos e próprios para um desenvolvimento autônomo e independente. A administração pública não pode continuar tão divorciada desses avanços da administração profissionalizada hoje largamente disseminados por todo o País.